“O que Comemos e Onde Vendemos – A Trajetória do Consumo e da Produção de Alimentos no Município de Valente” foi o tema da Oficina realizada na última segunda-feira, 17 de junho, no auditório da Fundação APAEB, em Valente (BA). A atividade reuniu lideranças comunitárias, agricultores e agricultoras familiares, representantes de cooperativas e associações, equipe técnica da Fundação APAEB, estudantes e professores da EFA, nutricionistas do PNAE e técnicos do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
A oficina teve como objetivo refletir sobre as transformações nos hábitos alimentares das comunidades rurais desde o início da década de 1990, as mudanças nos mercados de alimentos e o papel das políticas públicas nesse processo. A mística de abertura provocou lembranças afetivas ao convidar cada participante a compartilhar uma comida que remete à infância. Como gesto simbólico, todos receberam um saquinho com sementes crioulas de milho e feijão, reafirmando o elo entre tradição e soberania alimentar.

Ao longo do encontro, os participantes retomaram os principais achados da pesquisa-ação anterior sobre os sistemas agroalimentares de Valente e aprofundaram a análise por meio de dinâmicas em grupo. As atividades compararam os padrões de consumo alimentar das comunidades rurais nos anos 1990 com a realidade atual. Foram debatidas questões como a origem dos alimentos consumidos, os espaços de compra, a alimentação escolar e a importância das trocas e do autoconsumo. A participação das mulheres na preservação da cultura alimentar também foi destacada, especialmente seu papel fundamental na produção de alimentos e na condução de hábitos alimentares mais saudáveis dentro das famílias e comunidades.
Na sequência, os grupos sistematizaram as mudanças identificadas, apontando avanços, retrocessos e os fatores que impulsionaram essas transformações. Entre os aspectos negativos, destacou-se o aumento do consumo de ultraprocessados, a alta no preço dos alimentos — principalmente os saudáveis, cuja inflação acumulada ao longo dos anos é bem maior que a dos produtos ultraprocessados —, e a expansão das grandes redes de supermercados, como o atacadão instalado recentemente em uma cidade vizinha. Já entre os pontos positivos, os participantes destacaram a diversidade ainda presente na alimentação local e a criação de novas feiras agroecológicas e pontos de comercialização de produtos da agricultura familiar, mesmo que ainda enfrentem desafios de visibilidade e demanda.

As políticas públicas foram apontadas como ferramentas importantes para a valorização dos mercados locais e da alimentação saudável. Programas como o PAA, PNAE, Bahia Sem Fome e a retomada de ações de convivência com o Semiárido — como o P1MC, P1+2 com as tecnologias de Reuso de Água Cinzas e Bacia de Evapotranspiração, ATER, Bahia Sem Fome, Quintais Produtivos — fortalecem a agricultura familiar, estimulam a produção e a disponibilidade de alimentos saudáveis à população. No entanto, os participantes ressaltaram que ainda são necessários maiores incentivos, sobretudo no que diz respeito à organização e escoamento da produção, como forma de garantir sustentabilidade econômica às famílias agricultoras.
Outro ponto debatido foi a urgência na atualização do valor destinado à alimentação escolar. Os participantes defenderam que o orçamento do PNAE seja reajustado anualmente de forma permanente, garantindo maior poder de compra das escolas e valorizando a produção local.

Questões estruturais também foram levantadas, como a constatação de que famílias com acesso limitado à terra enfrentavam maior insegurança alimentar no passado, e que o autoconsumo tendia a aumentar nos períodos de chuva. Esse dado reforça a importância de investimentos públicos em infraestrutura hídrica para o fortalecimento da segurança alimentar no Semiárido.
Outro momento importante foi a construção coletiva de um diagrama de fluxos dos alimentos produzidos pela agricultura familiar em Valente. Os alimentos foram classificados em categorias (grãos e cereais, raízes e tubérculos, frutas, hortaliças e produtos de origem animal) e relacionados aos tipos de mercados nos quais são comercializados atualmente: mercados convencionais, pequenos comércios, feiras e programas institucionais como o PNAE e o PAA.
Ao final, os participantes avaliaram a oficina de forma positiva e foram convidados a continuar o debate na audiência pública marcada para o dia 15 de julho, às 9h, na Câmara Municipal de Vereadores de Valente, que dará continuidade às discussões sobre os rumos da produção, comercialização e consumo de alimentos no município.
A atividade foi promovida pela Fundação APAEB e AS-PTA, com apoio da Rede ATER Nordeste de Agroecologia, Brot für die Welt e financiamento do BMEL – Ministério Federal da Alimentação e Agricultura da Alemanha.
“Mesmo com os desafios, é possível enxergar um caminho de resistência e construção coletiva. A agricultura familiar de Valente continua a alimentar a população com diversidade, cultura e saúde”, destacou uma das participantes ao final da oficina.